segunda-feira, 9 de novembro de 2009

sonhos de chuva-pele.


Nem sempre foi assim.
Nem sempre fui assim.
Ontem, quando dormi, não tinha este rosto de hoje quando toquei o chão frio. Assim triste, assim magro, assim oco. Nem estes olhos tão vazios. Nem esta boca azeda.
Ontem não tinha estes membros apáticos. Assim tão moles, flácidos e frios.
Ontem não era casa deste coração escondido.
Eu não me apercebi que mudei. Eu disse-te que não me ia aperceber. Eu fiquei no ontem, no passeio da rua, em frente ao senhor da fruta e sem me preocupar se vinha alguém que quisesse passar. Eu fiquei ali, no chão, a ver a rua, a ver os carros. A ver o teu carro... A ver-te... Até te perder de vista.
Eu fiquei ali ao sol, ao frio, à chuva, ao vento.
Eu fiquei ali.

Uma vez por semana passo por mim. Ainda lá estou.
Lembro-me do sol e dos sorrisos, da vontade que amanheça depressa para sentir tudo de novo e ainda mais.
E finjo que está tudo bem.

Olhas para mim que não sou eu e só tu sabes.
Ali onde estou, na rua onde os nossos olhares se encontram até voltares, é noite.
As pessoas não imaginam porque estou ali. São tão ridículas as pessoas, tão inertes. As pessoas passam, falam e não imaginam. E nós olhamo-nos. E prendo os meus olhos com lágrimas soltas e deixo-te ir com tempestades de medo nos lábios a sorrir. Deixo porque tens de ir. Deixo porque não quero.
No abrigo do nós soubeste ser o vento na minha camisola. E eu despi-a para ti, a dar-te um coração que era o resto da vida.
E os outros amam o que é fácil...
E não sei como sentir.
A minha vida é um lençol branco que se soltou com o vendaval. Não sei por onde vou. Não sei para onde vou. Sei que não vou por aí. Fico ali, por enquanto, até ver de que cor fiquei.
E ali resgato o brilho dos olhos... Ali fujo dos conselhos sensatos.
"Porque a noite é um poema que conheço de cor e vou cantar-to até adormeceres."
Um pouco mais de sol.
Um pouco mais de azul.
Dorme azul. Sonha bem.
E fico no mundo sem ser do mundo porque o meu mundo está longe.

1 comentário:

Margarida disse...

deixo-te ir com tempestades de medo nos lábios a sorrir.

é triste, mas não deixa de ser bonito, desculpa.